sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Lições de sábado 364

Elegia
Ninguém tem o tempo.
Ele é feito de eternidades.
Domingos de Oliveira

Que nada se compare ao incomparável,
por ser da folha a razão da árvore.
O que existe sem o outro, existe ao meio,
meio feito, meio desfeito.
Nada se iguala ao mito
– lembrado por toda eternidade –
reverberando a paisagem íntima e perfumada,
qual sândalo em véspera de rito.
Sejam feitas as coisas mais amadas
e deixadas as outras ao acaso,
para que quando passe o tempo,
reste apenas o que não foi visto.
Guarde-me em teu olho e em tua boca.
A surpresa de se sentir
onde não mais estás presente.
Apenas lembrança que perdura.

Rio, 16/12/2000 – 13h56
in "Alba", Ibis Libris, 2001

Ilustração: Julia Flohr


sábado, 10 de agosto de 2019

Lições de sábado 363

O E-mail foi um erro?

Depois do fax, a comunicação escrita mais rápida foi o e-mail, superando todos os outros meios de mensagens imediatas, até o telégrafo e o telegrama, que antes do fax tinham seu lugar de destaque. O ICQ e o Messenger eram apenas comunicação, enquanto o e-mail guardou a aura de documento, melhor que o fax, que era uma cópia, um xerox a jato, passando a ser usado como prova em processos judiciais. Hoje não fazemos mais nada senão responder emails, mensagens em WhatsApp e Instagram e os Inboxes que entraram no lugar do Messenger com o mesmo nome. E tudo isso simultaneamente. Quem envia e-mail hoje manda também um zap para avisar que você tem uma mensagem dessa pessoa. E não podem ver você online, a qualquer hora, que querem conversar sobre trabalhos em andamento. A privacidade foi reduzida a zero se você não desligar tudo, até o telefone fixo. Quem liga no celular faz a pergunta mais inócua: "Você está ocupado?" Se estou atendendo, não e certamente poderei falar, mas com certeza estaremos fazendo alguma coisa, porque nunca estamos desocupados. O melhor é não atender. A comunicação foi abalada de forma cabal. Antes recebíamos cartas, bilhetes, cartões postais, telegramas (quando era muito urgente), telefonemas até, e falávamos o tempo que fosse necessário. Agora nunca podemos, porque temos de responder a mensagens instantâneas e emails que não param de chegar. Ou seja, estamos nos supercomunicando, que é o exagero dessa enxurrada de mensagens que entram o tempo todo, até do que não interessa. Antes havia o spam, o junk-mail, o marketing eletrônico, mas a duplicidade está dando um nó nas conversas. Tento manter a comunicação por escrito que é mais segura para se acompanhar o andamento, mas insistem em falar o resto por zap ou inbox. É de enlouquecer. E agora descobrem (ainda bem) que é melhor conversar pessoalmente. Uma reunião ao vivo e a cores resolve melhor do que passar tudo por e-mail, pois nem sempre conseguem ler direito o que escrevemos. Quando fica complicado, eu ligo. Mas os tempos estão mudando. Daqui a pouco, nem os e-mails serão suficientes para dar vazão ao acúmulo de mensagens que chegam até nós.

10/08/2019 - 16h29