MIND THE GAP
Estamos tão
acelerados (ou desacelerados) em relação aos últimos acontecimentos, que hoje
não parece sexta, a semana passou voando, o tempo relativo difere do tempo
absoluto, e nos sentimos vivendo um hiato, um lapso, um gap, até que tudo se conclua,
ao serem marcadas para domingo a decisão que poderá mudar ou acertar o destino
do país. Um destino que vem a cada dia degringolando mais ainda, com vazamento
de delações, com novas declarações e depoimentos paralelos, com gravações
inesperadas de confissões em tribunais, sentimentos misturados sobre o que vem
nos assoberbando sobremaneira, que hoje parece sexta-feira, talvez segunda ou
terça, porque o tempo relativo não é o absoluto e nos vemos cercados de
ameaças, de hesitações, de afrontamentos que nunca esperávamos sofrer, nem
testemunhar. O crime tornou-se banal. A corrupção tornou-se diuturna. A vida
parece não ter mais valor diante de tanta mágoa, tanto horror. Já não bastavam
as notícias ruins de cada dia, em que eu pensava: "Esta é a pior notícia
que eu já li", e no dia seguinte, eu lia uma pior ainda. Estamos sendo
enxovalhados com más notícias. Uma guerra psicológica está em andamento. Um
golpe de notícias pavorosas. Fora os sofrimentos do dia a dia, da falta de
remédios, médicos, atendimentos, salários, empregos, trabalho, dinheiro. Nunca
antes na História deste país estivemos tão sofridos (ou sofremos mais, e não me
lembro?). O cérebro não se lembra de dores passadas, só das presentes. A dor
que passou é uma dor que superamos. E a dor presente ainda não se foi. Por isso parece
maior que todas as outras. E, enquanto tudo isso durar, estaremos indo ladeira
abaixo, às vésperas da primeira Olimpíada que irá acontecer no Brasil. A Copa
do Mundo foi um pavor. Que a Olimpíada pegue mais leve.
8/04/2016 – 18h02
Ilustração de Julia Flohr