sábado, 8 de fevereiro de 2020

Lições de sábado 370

A morte realmente não tem jeito. Queremos tanto entender a vida, mas essas doenças, acidentes, assassinatos são inexplicáveis. Porque a vida tem que acontecer em etapas, aqui e lá, antes, durante, depois, este é o questionamento que se faz desde Platão, que imaginava a vida como um reflexo imperfeito de alguma perfeição. "O que está em cima está embaixo". Se nascemos para nos aperfeiçoar, por que sair da vida sem saber para onde se vai, porque, por mais fé que se tenha, não sabemos nada. Se o próprio Cristo morreu como morreu para provar que existe vida eterna, mas que não podemos ver. Eu só sei que quem parte continua vivendo em nós. Uma parte deles fica. Meu pai, minha mãe, meus avós, minha amiga Ana Heloísa Páscoli, que, de alguma maneira, se comunicou comigo. Ela estava no meu pensamento, enquanto eu ia para o Caju, dizendo: "Não tem problema, pode vir", porque eu estava atrasada para o velório. Tantos escritores que já partiram que continuam em seus livros, em seus textos, em suas palavras, em seus poemas. Vendo assim, a morte não tem importância. Mas, nos afeiçoamos de tal forma à vida, que não sabemos o que virá, por mais que nos contem histórias de fantasmas ou espíritas. Eu tenho minha própria crença, apesar de tudo o que já aprendi. Somo todas as crenças para tentar entender o que uma só não explica. E vejo que ninguém sabe totalmente. Minha colega de colégio, Norma Fairbanks, da mesma turma da Ana Heloísa, acreditava que iria se recuperar. Que o tratamento iria curá-la, mas sua doença é inoperável. Enquanto isso, no mesmo hospital, outro amigo, que é como um pai para mim, Jorge Mauad, está com uma embolia no pulmão, ocasionada por uma queda e fratura do fêmur, cumulado com problema cardíaco. A família está inconsolável e eu também. Mas ambos são grandes almas. Dou a desculpa de que quem é melhor vai antes, já se aperfeiçoou, cumpriu a missão, embora não saibamos nada sobre isso, nem para nós mesmos. Este ano, Kirk Douglas puxou a fila, morrendo aos 103 anos, é claro, antes da entrega do Oscar, para poder receber uma homenagem especial na entrega das estatuetas. Timing perfeito. Spartacus sabia como sair de cena de forma espetacular, assim como viveu a vida. Assim saibamos nós, que somos a única espécie com amnésia. Não sabemos nada, e tudo temos que aprender do zero. O joão-de-barro não vai para a faculdade para aprender a construir sua casinha, mas a constrói assim mesmo. Ou seja, espécie sem amnésia. E ter memória (agora dá para entender Gurdjieff melhor) é fundamental para a evolução. "A evolução possível do homem", sim, possível, como disse seu discípulo Ouspensky, porque é necessário querê-la. Exige esforço. "Lembre-se de si mesmo". Assim teremos eternidade, porque somos apenas o que lembramos. E, para lembrar, é preciso despertar o cérebro de seu sono. Por isso, Gurdjieff dizia: "Lembre-se de si mesmo". 

8/02/2020 - 14h19 

"Honi soit qui mal y pense", lema da Ordem da Jarreteira, no Castelo de Windsor. 

domingo, 2 de fevereiro de 2020

Lições de sábado 369

Um dia uma amiga me disse: "Um beijo não dado é um beijo perdido para sempre". E a partir desse dia eu passei a considerar muito importantes as chances que eu tinha de fazer algo que poderiam não ser repetir mais. Percebê-las como únicas. Deixar para depois nem sempre é a melhor opção. Há momentos em que devemos não agir, mas outros não se repetem. Hoje é um dia desses. Dois de fevereiro de 2020. Um dia capicua, com apenas dois números. Um capicua dentro de outro. 02 0220 20. E também dia de Iemanjá. E Groundhog Day, nos Estados Unidos e Canadá. Dias decisivos. E aniversário de James Joyce. Quem lembrava dessa? Sua editora, Sylvia Beach, sabia que ele, doido por números como era, não poderia receber a primeira edição de "Ulysses" senão nesse dia: 2/02/1922, quando completou 40 anos de idade. Um dia certo para o livro certo. Mas a mesma amiga mandou um recado para mim no dia do seu enterro: "Um beijo dado é um beijo guardado para sempre", enquanto eu atravessava o Cemitério do Caju em direção ao crematório. Assim ela me respondeu quando à aflição de eu não perder a oportunidade de nada. Aquilo que se faz, está feito. E o que não se fez, talvez nunca mais possa ser feito, por isso é preciso prestar atenção aos sinais, para saber quando devemos dizer sim ou não. Parece difícil? É pura falta de treino. Quando abrir mão de fazer algo, não se lamente. E se não puder fazê-lo contra sua vontade, também. O melhor é aceitar o que foi-lhe dado de presente, ou seja, a chance de fazer o que escolheu fazer, e dar certo. Se não der, paciência. Mas preste atenção aos sinais, para estar exatamente onde deve estar. 

2 de fevereiro de 2020 - 23h22