sexta-feira, 20 de março de 2015

Lições de sábado 198

Maria Thereza Silveira de Barros Camargo, minha avó e minha mãe, Maria Thereza de Barros Camargo, com dois anos e meio, em novembro de 1930, em Limeira, alguns anos antes de minha avó se tornar a primeira prefeita do Estado de São Paulo, e minha mãe, uma das primeiras arquitetas a se formar em 1953, na Faculdade de Arquitetura Mackenzie, pioneiras em seus campos profissionais. D. Therezinha, como era conhecida, era "a única mulher que mandava em homem no interior de São Paulo". Participou da Revolução Constitucionalista, em 1932, como chefe do banco de sangue da Santa Casa de Limeira, e depois foi nomeada prefeita, em 1934, recebida por Guilherme de Almeida, em sua posse, renunciando para se candidatar a Deputada Estadual na Constituinte desse ano. Foi cassada no Estado Novo, instalado em 1937, com os demais deputados. Voltou em 1945, após a renúncia de Getúlio Vargas, filiando-se ao PSD, ao lado de Ulysses Guimarães, de quem era madrinha política. Sua casa em Limeira era visitada por políticos nacionais e internacionais que vinham aconselhar-se com ela. Em 1948, o PSD aliou-se ao PTB e teve de apoiar a candidatura de Getúlio à presidência em 1950, por determinação do partido. Nessa ocasião, recebeu a visita de Vargas, que se hospedou em sua casa durante a campanha. Era neta do primeiro presidente civil eleito por voto direto, Prudente de Moraes, e nasceu três dias antes de sua posse em 12/11/1894, e foi batizada no Palácio Itamaraty. Brincou nos jardins do Palácio do Catete entre 1897 e 1898, dos 3 aos 4 anos de idade. Foi atuante nos bastidores do partido durante todo o período após o Estado Novo até o golpe militar de 1964. Minha homenagem hoje a essas duas mulheres que determinaram o eixo e a direção da minha vida pela educação e formação que recebi. Não convivi muito com minha avó, pois minha mãe era a caçula de seis irmãos, e eu uma das últimas netas, portanto, ela já sofria de arteriosclerose quando eu era adolescente. Morei em sua casa em São Paulo, na Av. Brasil, na esquina da Rua Venezuela, entre 1959 e 1960, quando meu irmão nasceu. Lembro, no entanto, de um almoço, aos dois anos de idade, quando quis repetir o manjar branco e meu pai me impediu. Vovó, que adorava crianças (e brincava também de passa-anel comigo), disse-lhe: "Deixe a menina comer". Nunca um manjar branco teve um gosto tão maravilhoso como aquele. Como tinha feito o magistério, alfabetizou todos os filhos, e dos vizinhos que vinham brincar na chácara em Limeira. Sua plataforma política era "fechar cadeias e abrir escolas", além do voto distrital, também defendido por Ulysses. Hoje em Limeira há uma escola pública que leva seu nome. Coincidentemente, sua casa em São Paulo tornou-se a Escola Morumbi. A chácara de Limeira foi desapropriada e durante algum tempo foi a Câmara Municipal. A piscina olímpica que mandou construir para os filhos (pois adquirira o imóvel de seu cunhado para a propriedade não sair da família, depois que ficou viúva, em 1930), é hoje a piscina municipal de Limeira. Além da atividade política, assumiu, após a morte do meu avô Trajano de Barros Camargo, a fábrica de máquinas de beneficiamento de café, a Machina São Paulo, que foi vendida em 1960, para a Mercedes-Benz. Minha avó faleceu em 1974, aos 79 anos e minha mãe no ano passado, aos 86. A bênção, minha avó, a bênção, minha mãe.

8/03/2015 - Dia Internacional da Mulher




Limeira, novembro de 1930.

Lições de sábado 197

Missão: aniquilar a ignorância. Incutir em todos os valores da literatura, dos livros, dos poemas, dos romances, da História, das personalidades históricas, dos personagens literários, das lendas, dos contos de fada, das parábolas, das crônicas, dos contos, dos filmes, dos desenhos animados, das histórias em quadrinhos, criando uma conversa mais rica e útil, espalhar a cultura geral, o conhecimento, os detalhes biográficos, a História do Brasil, os políticos notáveis, criando uma perspectiva histórica, explicando a base legal da Constituição, das leis novas e antigas, o uso correto da gramática e do vernáculo, as acepções das palavras, a origem das expressões que usamos, os usos e costumes dos negros e dos índios, dos povos que imigraram para o Brasil trazendo suas tradições, a herança portuguesa. Explicar de modo muito simples como aconteceram essas influências ao longo do tempo, dando mais importância à nossa própria existência.

20/03/2015 - 22h00




Foto de Vitor Vogel para "As liras de Marília", Ibis Libris, 2013. 

quinta-feira, 12 de março de 2015

Lições de sábado 196

Há dias em que nem deveríamos acordar, como disse Silvio Ribeiro de Castro em seu poema "Amantes", mas temos de sair da cama assim mesmo. Nada dá certo nesse dia. Recebemos uma carta de cobrança, um mandado de intimação, um oficial de justiça na porta, um telefonema do banco, um e-mail de alguém insatisfeito, um boleto de custas judiciais da Vara da Fazenda Pública de uma dívida herdada dos nossos pais. Há dias em que não estamos preparados para receber más notícias, mas temos de recebê-las assim mesmo. A morte de um conhecido, o acidente de um ator famoso, a condenação de um músico por fraude, quando tudo que ele queria fazer era prestar uma homenagem ao cantor. A primeira página do jornal está cheia de notícias terríveis. Vão aumentar a alíquota do imposto de renda, a luz e a água subiram, o IPTU está mais caro, a água vai ser racionada, os preços do supermercado subiram, mas temos de pagar as contas do mês assim mesmo. A única diferença quando essas coisas acontecem e quando não acontecem é que agora sabemos quem é o inimigo e o tamanho da fatura que teremos de pagar, e que tudo que fizemos até hoje pode ser entendido ao contrário, porque quem nos vê pensa que tudo nos é dado de graça, quando isso não é verdade. Só nós sabemos quanto temos de correr para ficar no mesmo lugar, como é matar um leão por dia, o esforço que fazemos para que tudo dê certo no final. Mas ninguém se importa. Só interessa o flash e o clique da máquina fotográfica congelando o momento e ali você parece feliz e despreocupado. Não interessa se a pressão subiu ou possa estar sofrendo de diabetes. O mundo não é uma foto no Facebook. Há dias que pedimos que acabe logo, mas ele irá durar as exatas 24 horas de qualquer dia. E nossa vida o tempo regulamentar ou até puxarem o cartão vermelho do bolso e nos colocarem para fora de campo. Até lá, sorria. Não vai fazer a menor diferença se der certo ou não, porque tudo no final se ajeita. Os caminhos são tortos, e muito tortos, por sinal. Já passamos por tantas poucas e boas, e não vai ser agora que isso vai mudar. Dizer que eu errei não me faz ter cometido o erro. A crença de que erramos não é o erro. Quando nos acusam, acusam em si mesmos o que não fizeram e temos de provar a nossa inocência, quando se é inocente até prova em contrário. Há dias que não deveriam existir no calendário, mas existem. E nada pode ser feito para evitá-los. Mas acredite que, no final, o feitiço vira contra o feiticeiro.
12/03/2015 - 21h51


sábado, 7 de março de 2015

Lições de sábado 195

Deixamos para depois as primeiras necessidades. Aprendemos a procrastinar. Um desejo adiado é um desejo irrealizado. "Um beijo não dado é um beijo perdido para sempre", disse-me uma amiga quando eu tinha 13 anos de idade, e nunca mais esqueci disso. Pautei a partir dessa frase todas as decisões que tomei na vida. Eu não deixava para depois o que poderia fazer agora. Não fazer algo poderia adiar para sempre o que eu desejava fazer. Então, por que esperar? Saber tomar decisões na hora certa é fundamental para acertar seu futuro. Dúvidas e decisões adiadas suspendem os efeitos das nossas ações. Não agir é o melhor modo de não ser, exceto quando for uma escolha. Também é preciso saber quando não agir. Trinta anos depois, minha amiga morreu, mas no dia do seu enterro, um pensamento me assaltou enquanto eu atravessa o cemitério até o crematório: "Um beijo dado é um beijo guardado para sempre". Era a resposta que ela guardara para mim mesmo atrasada para o velório e a cerimônia de cremação no Caju. Aprendi com ela a não adiar, a não procrastinar, a não deixar para depois o que poderia fazer agora, e somente adiar o que fosse impossível fazer hoje. Aprendi com outra amiga a não me esforçar desnecessariamente. Todo esforço induz ao erro. "Suavemente, sem esforço", ela dizia. Então aprendi a esperar o momento de agir, quando não houvesse esforço. Aquilo que vinha naturalmente era o sinal do acerto. Buscar o equilíbrio entre agir e não agir é uma ciência pouco estudada. E saber ler os sinais do que está à nossa frente. Aceitar o imponderável e compreender o imprescindível. Seguir a intuição. Decifrar o que nos é apresentado como segredo. Os gênios aprendem a decodificar o presente. Nele está tudo que precisamos saber trazido do passado, e que nos mostram, por meio de símbolos, o que precisamos aprender.
7/03/2015 - 16h37