sábado, 15 de outubro de 2016

Lições de sábado 262

Cada um tem o seu herói. Quando somos pequenos, queremos ser Peter Pan, ou Sininho, e sair voando até a Terra do Nunca. Não medimos esforços para conviver com nossos ídolos infantis, sejam da Disney ou da Marvel. Todo mundo já adorou assistir a Batman e Super Homem, mesmo antes de se digladiarem, e Capitão América e Thor continuam cada vez melhores. Não há Star Trek que nos impeça de sonhar com mundos onde o homem jamais esteve. Mas os heróis têm um motivo. Ninguém cantou "Twist and shout" só por gritar. Havia algo de derradeiro e de dernier cri nesse movimento pop que fez com que todos mudassem de modos e costumes. O mundo não foi mais o mesmo depois do rock'n'roll, dos beats e da contracultura. Por mais negligenciados que tenham sido (e foram). Mas os heróis ou heroínas são feitos de múltiplas máscaras que vestimos para enfrentar o mundo. São contos de fada modernos. Vêm embalados em velocidade do som e em anos-luz. Queremos escapar para um lugar onde ninguém irá atrás de nós. Somos Blade Runners involuntários, vivendo num mundo que pertence cada vez menos a nós. E os mitos, mitologias, fantasias, histórias em quadrinhos, ficções científicas e, por que não dizer, a literatura, preenchem esse vazio existencial que é o dia a dia. Escolhemos heróis para encarar a vida. Eles nos dizem que vale a pena seguir, mesmo que seja por uma via estreita, a mais difícil, a menos ponderada. Bob Dylan fez isso, não a mim, mas a muitos dos seus fãs. Eu escolhi outros heróis. Talvez não tão descolados, tão engajados, tão hardcore como Dylan, mas eram meus heróis e heroínas, que continuam me fortalecendo, seja Capitu, em "Dom Casmurro", seja Lorelei, em "Um aprendizado", de Clarice Lispector. Ter heróis é importantíssimo. Eles entram no lugar dos deuses mitológicos, quando não forem estes que nos ajudam a continuar.
Viva o professor! 
15/10/2016 - 18h43


quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Lições de sábado 261

Não sou mais criança. Aprendi duramente como amadurecer. Nada foi dado de graça, por mais benesses que eu desfrutasse. Tudo teve um custo. Tudo teve um preço. Por mais que eu tentasse, algo parecia falhar. Perfeição dura a chegar. Aprendi a me aperfeiçoar aos poucos. Lentamente. Como quem ergue um edifício. Para, do alto, poder contemplar a planura. E, durante o caminho, tropecei, fui alvo de críticas e puxadas de tapete, de mentiras e traições, de inverdades e injúrias. Nem todos permaneceram comigo. Poucos conhecem os degraus da escada que subi. Mas quem viu de perto, sabe o que houve, sabe o que eu fiz e por quê. Quem não souber, não vale a pena explicar. Vai demorar muito tempo. Descobri que é melhor depurar-se do que se deixar poluir. Aos poucos, saber fazer melhor. É um longo treino, que leva a vida inteira. E, às vésperas dos sessenta anos, só fui superada por quem chegou lá antes de mim. Por não ser mais criança, aprendi o que deveria saber há muito e, ao mesmo tempo, não esqueci o que é ser criança. Eu nunca fui mais velha do que dezoito anos. Dentro de mim, guardo essa idade. Para que, mais tarde, eu me lembre de mim.

6/10/2016 - 00h34 

Para Hariklia Papapetrou, que lê todas as Lições de sábado e fica esperando por elas. Gratidão, amiga.

Foto de Fabio Giorgi: "7o. dia de chuva".