quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Lições de sábado 274

Há um modo de ver as coisas que pode passar despercebido.
Mas ao serem mostradas, tornam-se visíveis.


23/12/2016 - 13h30


Lições de sábado 273

Tenha amigos que:
1. Gostem de tomar café com você.
2. Convidem para ir ao cinema.
3. Deem livros de presente.
4. Lembrem de você por acaso.
5. Comprem um presente que é "a sua cara".
6. Falem bem de você para os outros.
7. Defendam-no quando alguém falar mal.
8. Liguem só para saber se está bem.
9. Escrevam uma carta ou um poema para você.
10. Convidem para ir em sua casa e o visitem de vez em quando.
Amigos assim são raros e devem ser preservados. A recíproca deve ser verdadeira. Cuidem de seus amigos, porque depois de algum tempo é tudo que se tem.


quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

Lições de sábado 272

Brasil é uma sucessão de erros que queremos que deem certo. Começa com um descobrimento de coisa sabida, passa pelas mãos de degredados e piratas, vira jazigo de ouro e pedras preciosas, é depenado, depauperado e explorado, torna-se receptáculo do maior contingente de escravos da África, é o último a libertá-los, tem rei, imperador e presidente, um sem número de constituições, petróleo e todas as riquezas minerais, fauna e flora, em que se plantando tudo dá, mas nunca teve a decência de seus governantes, salvo honradas exceções. A História do Brasil é um erro tão grande que depois de ter elegido o partido dos trabalhadores e perdido o que lhe restava de honradez, está às cegas à procura de uma porta que lhe mostre a saída desse circo de horror. Pobre, envergonhado, enxovalhado e ridículo. Pois só quem é ridículo aceita tanta humilhação.

23/11/2016 - 19h45


segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

Lições de sábado 271

Sempre no final do ano muitos se vão. Como se escolhessem o final da linha para terminar a jornada. A lista daqueles que partiram no fim do ano se alonga quanto mais se pensa que a missão deles se cumpriu. Achamos que a vida deveria durar mais, toda vez que alguém morre. Aí nos lembramos que ela não é infinita. Mas estar aqui nos faz sentir imortais. Enquanto houver vida, nós a viveremos. E não pensaremos que um dia isso acaba. Até o dia que acabar. Os que partem, vão inteiros. Nós que ficamos sós com a partida.

4/12/2016 - 9h10


Lições de sábado 270

A felicidade é o biscoito mais fino do pacote, que rompe ao menor toque, que se esfarela entre os dedos e deixa um rastro de açúcar por toda a parte.

5/12/2016 - 16h


Lições de sábado 269

Onomatopeia. O som das coisas como elas são. Eu só lembrei dessa palavra agora. Quis usar antes, mas me escapou. Deve ser o cansaço. Muita coisa nesse final de ano. Muitas despedidas, muitas partidas, muitos adeuses. Isso quer dizer por outro lado que haverá chegadas, novidades e coisas novas acontecendo. A vida não para. É um moto contínuo. Uns vêm e outros se vão. Para chegar é preciso partir. E depois da partida de uns, outros chegarão. É preciso abrir espaço para o novo.
7/12/2016 - 2h37



Lições de sábado 268

O Brasil é esse país híbrido em que a República se debate com a escória, a democracia respira por aparelhos, a lei se arrasta por túneis, os legisladores se esgueiram entre trincheiras e os juízes tentam conter o que resta de seriedade do poder que emana do povo e em seu nome é exercido.

8/12/2016 - 00h12


Lições de sábado 267

Meu pai era o chefe do departamento jurídico do Itamaraty quando chegou para ele esta consulta: qual deveria ser o nome do país a partir da constituição de 1967, que até então chamava-se Estados Unidos do Brasil? Papai pegou o texto da nova constituição que estava em tramitação na Assembleia Constituinte e leu: "Art 1o.: O Brasil é uma República Federativa", portanto, República Federativa do Brasil. Estava dado o nome ao país como se fosse o ovo de Colombo, mas papai nunca quis assumir a autoria, embora tivesse escrito isso em seu parecer. Ele deu o nome ao Brasil e continuou incógnito. Na mudança para a atual constituição, eliminou-se esse artigo e copiou-se o introito da constituição americana, embora não sejamos mais Estados Unidos do Brasil.

8/12/2016 - 6h18


Lições de sábado 266

Os últimos fatos me mostraram o seguinte: que a verdade é melhor do que a pior mentira e agir de boa fé nos protege de um azar maior. Nem tudo acontece como se espera, mas pode acontecer melhor do que se esperou.

10/12/2016 - 8h07


Lições de sábado 265

Para os brasileiros, a galeria de presidentes da República é um encontro de personagens sui generis. Observando os que estão aí, o meu tataravô Prudente de Moraes não poderia deixar de estar, bem no alto, ao lado da Marianne, a imagem francesa da própria República. Fora uns três que não reconheço, essa capa é nova, pois já inclui Dilma Roussef. Eu tinha esquecido que o autor Paulo Schmidt estava na minha lista de contatos. Eu não sou muito fã de um guia politicamente incorreto, mas é o que os brasileiros precisam ser, politicamente incorretos para suportar a atual cena política. Já que a vergonha na cara virou artigo de luxo, vamos entender essa gente que acaba sendo eleita por nós (quer dizer a maioria, já que a maioria é que manda).

11/12/2016 - 11h48


Lições de sábado 264

Meteoros, asteroides, cometas, nuvens cósmicas, planetas, sóis, estrelas, luas, o cosmos gira à nossa volta e nós à volta de nós mesmos, girando em revoluções e translações, esperando o ano recomeçar, como se mudássemos o destino mudando de filme, de livro, de casa, de bairro, de mulher, de marido. Os cometas sempre retornam ao seu lugar de origem, cumprem sua longa órbita oblíqua, tornando-se novamente visíveis. Tudo é efêmero e tudo passa, só importa o hoje, o agora, aqui, este instante, este pensamento, porque tudo o mais é inconsútil, é memória, lembrança, reminiscência, e o que faremos pertence ao porvir, o tempo espacial ao qual pertenceremos no futuro.
12/12/2016 - 2h40


sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Lições de sábado 263

O que passa pela sua cabeça há mais tempo? Qual ideia você trouxe da infância? Ontem eu li num livro de frases: "O menino é o pai do homem". É assim desde Aristóteles, é assim desde Freud. Tantos pensadores refletiram sobre a vida e sabiam que sua infância pontilhou seu futuro. O que é mais caro a você desde que você se dá por gente? Aquilo que faço hoje é reflexo do que sempre fiz desde menina: ler livros e contar histórias. E por isso passei a fazê-los e é um aprendizado constante. Tudo que penso está em "Alice atrás do espelho", livro que li quando menina. Minha vida é um jogo de xadrez. Montar estratégias. De peão chegar a rainha. Lembram da história?
4/11/2012 - 11h43


sábado, 15 de outubro de 2016

Lições de sábado 262

Cada um tem o seu herói. Quando somos pequenos, queremos ser Peter Pan, ou Sininho, e sair voando até a Terra do Nunca. Não medimos esforços para conviver com nossos ídolos infantis, sejam da Disney ou da Marvel. Todo mundo já adorou assistir a Batman e Super Homem, mesmo antes de se digladiarem, e Capitão América e Thor continuam cada vez melhores. Não há Star Trek que nos impeça de sonhar com mundos onde o homem jamais esteve. Mas os heróis têm um motivo. Ninguém cantou "Twist and shout" só por gritar. Havia algo de derradeiro e de dernier cri nesse movimento pop que fez com que todos mudassem de modos e costumes. O mundo não foi mais o mesmo depois do rock'n'roll, dos beats e da contracultura. Por mais negligenciados que tenham sido (e foram). Mas os heróis ou heroínas são feitos de múltiplas máscaras que vestimos para enfrentar o mundo. São contos de fada modernos. Vêm embalados em velocidade do som e em anos-luz. Queremos escapar para um lugar onde ninguém irá atrás de nós. Somos Blade Runners involuntários, vivendo num mundo que pertence cada vez menos a nós. E os mitos, mitologias, fantasias, histórias em quadrinhos, ficções científicas e, por que não dizer, a literatura, preenchem esse vazio existencial que é o dia a dia. Escolhemos heróis para encarar a vida. Eles nos dizem que vale a pena seguir, mesmo que seja por uma via estreita, a mais difícil, a menos ponderada. Bob Dylan fez isso, não a mim, mas a muitos dos seus fãs. Eu escolhi outros heróis. Talvez não tão descolados, tão engajados, tão hardcore como Dylan, mas eram meus heróis e heroínas, que continuam me fortalecendo, seja Capitu, em "Dom Casmurro", seja Lorelei, em "Um aprendizado", de Clarice Lispector. Ter heróis é importantíssimo. Eles entram no lugar dos deuses mitológicos, quando não forem estes que nos ajudam a continuar.
Viva o professor! 
15/10/2016 - 18h43


quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Lições de sábado 261

Não sou mais criança. Aprendi duramente como amadurecer. Nada foi dado de graça, por mais benesses que eu desfrutasse. Tudo teve um custo. Tudo teve um preço. Por mais que eu tentasse, algo parecia falhar. Perfeição dura a chegar. Aprendi a me aperfeiçoar aos poucos. Lentamente. Como quem ergue um edifício. Para, do alto, poder contemplar a planura. E, durante o caminho, tropecei, fui alvo de críticas e puxadas de tapete, de mentiras e traições, de inverdades e injúrias. Nem todos permaneceram comigo. Poucos conhecem os degraus da escada que subi. Mas quem viu de perto, sabe o que houve, sabe o que eu fiz e por quê. Quem não souber, não vale a pena explicar. Vai demorar muito tempo. Descobri que é melhor depurar-se do que se deixar poluir. Aos poucos, saber fazer melhor. É um longo treino, que leva a vida inteira. E, às vésperas dos sessenta anos, só fui superada por quem chegou lá antes de mim. Por não ser mais criança, aprendi o que deveria saber há muito e, ao mesmo tempo, não esqueci o que é ser criança. Eu nunca fui mais velha do que dezoito anos. Dentro de mim, guardo essa idade. Para que, mais tarde, eu me lembre de mim.

6/10/2016 - 00h34 

Para Hariklia Papapetrou, que lê todas as Lições de sábado e fica esperando por elas. Gratidão, amiga.

Foto de Fabio Giorgi: "7o. dia de chuva".

domingo, 11 de setembro de 2016

Lições de sábado 260

A revisão é uma arqueologia do poema. Vamos tirando por camadas e enxergando mais fundo. Não há como ver tudo de uma vez, nem se perguntar por quê. Há coisas que só se descobre no processo. O que pensamos no início muda no final. Fazemos pequenas loucuras todos os dias, como continuar vivos e desafiar o equilíbrio das coisas ao continuar nos movimentando. Estamos em contínuo desafio às leis da natureza. Queremos ser como somos e não como querem que sejamos. E isso é estar além do que foi pensado ou se pensou de nós. Nós que não pensamos o que somos e somos o que somos mesmo assim. É um profundo exercício fazer livros, sabendo que é uma atividade limite, limítrofe a todas as outras. Vivemos apesar e sem eles. É como se existíssemos à parte de tudo que dá dinheiro, e fizéssemos o que ninguém espera, mas mesmo assim esperam de nós. Tenho pensado muito sobre isso, já que o tempo avança e parece desafiar o que faço como o faço. É preciso mudar, adaptar-se, ser mais blogueira e Kéfera para ter mídia, milhões que visualizam youtubes e coisas afins. E se nada disso importa? E o que importa é o que somos, mesmo que ninguém saiba e não saia em mídia nenhuma? Quando vejo editores vendendo os tubos com livros sobre economia ou vampiros, ou qualquer outra coisa que não seja poesia, penso, deixe estar, eu não saberia vender minha alma para esse tipo de coisa.

11/09/2016 - 16h36


quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Lições de sábado 259

Livros de poesia são pièces de résistance. Quando tudo o mais parece fenecer, eles sobrevivem dando novo fôlego a quem pensa que está no fim. Quando não há mais nada a ser feito, os poemas são escritos, na solidão, na clausura, na prisão, no exílio. As cantigas de amor e de amigo surgiram na distância. A poesia supre quando se pensa não mais haver saída, porque é escrevendo que aprendemos a esperar. E os que leem aprendem também. Como o poema de William Ernest Henley, que Nelson Mandela leu durante 30 anos em sua cela, acreditando que um dia iria sair de lá, invicto, com a cabeça erguida, como diz o poema. Muitos poemas alimentam nossos sonhos e constroem a nossa fé. Seja escrevendo ou lendo-a, a poesia tem sido o cimento para abrirmos as estradas para onde queremos ir. 
Minha tradução para o poema de William Ernest Henley (1849-1903):
INVICTUS (1875)

Diante da noite escura que me cobre,
Como uma cova aberta de um lado a outro,
Agradeço aos deuses
Por minha alma invencível.
Nas garras vis das circunstâncias,
Não titubeei, nem chorei.
Sob os golpes do infortúnio,
Minha cabeça sangra ainda erguida.
Além deste vale de iras e lágrimas,
Assoma-se o horror das sombras,
E apesar dos anos de ameaças,
Sempre me encontrarão destemido.
Não importa quão estreitas sejam as passagens,
Nem quantas punições sofrerei:
Eu sou o senhor do meu destino:
Eu sou o capitão da minha alma.
Tradução: Thereza Christina Rocque da Motta
William Ernest Henley escreveu o poema em 1875, mas somente o publicou em 1892, numa coletânea chamada "Echoes".

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Lições de sábado 258

Um homem tem que ser completo. Se não for, nem adianta começar. Um homem de verdade aprende a conviver com você, e ama-a tanto que deixa de se importar com suas credulices. O problema que esse homem nem sempre vai estar disponível, mas quando estiver, use-o!

25/07/2014 - 9h55


quinta-feira, 21 de julho de 2016

Lições de sábado 257

A dor é um instrumento de sabedoria. Se assim não fosse, não haveria sofrimento de espécie alguma. Ele sempre nos conduz a uma compreensão que não tínhamos, mas que ocultamos em alguma parte do nosso ser. A perda, o mal entendido, a ausência, a carência, o desconforto, a doença, o medo, a rejeição são dores que mal conseguimos administrar, ou então negligenciamos. Todas essas dores são portadoras de sabedoria, até passar. Quando passam, descobrimos que aquele caminho nos tornou melhores. Mas, enquanto não passa, temos de suportar.

21/07/2012 - 15h32


sexta-feira, 17 de junho de 2016

Lições de sábado 256

Uma mão lava a outra e as duas lavam a cara. Cooperação. Reciprocidade. Empatia. Se estamos aqui para aprender o certo, o errado está por toda parte para sabermos o que não é certo. Embora, sem dicotomias, não pudéssemos distinguir o bem do mal, o universo trabalha para o Bem, mesmo quando o mal mostra a cara. Ele é o guarda que desvia o trânsito para você chegar no mesmo lugar, só que demora mais tempo.
17-06-2016 - 21h12


quinta-feira, 16 de junho de 2016

Lições de sábado 255


Tudo se acrescenta, quando pensamos perder. O maior sentido está no vazio, onde tudo se avoluma, por haver mais espaço para pensar no que nos falta.
16/06/2016 - 13h17


sexta-feira, 3 de junho de 2016

Lições de sábado 254

Numa regressão espontânea, eu cheguei a uma porta que se abria para um lugar onde vivi há 2.000 anos. Eu estava acordada, não era sonho, mas estava de olhos fechados, e tudo que via era nítido. Minha consciência incluía outra vida que passou a se mostrar como um filme guardado em minha mente. Uma voz me dizia quem eu era, e onde estava, de quem descendia, o que eu fazia, quem eram meus parentes. Eu era grega, mas vivia em Roma, na época de Cristo. Era uma vestal e morri muito velha, depois de servir 30 anos ao templo de Vesta. Eu me chamava Artemísia. Coincidentemente, é o mesmo nome da mulher de Mausolo, para quem ela mandou construir o Mausoléu de Halicarnasso, uma das sete maravilhas do mundo antigo. Viver era só servir.

5/05/2012 - 16h33 


Lições de sábado 253


Sempre que pensamos em fazer algo, se não deve ser feito, surge um imprevisto que impede que você cumpra seu intento. Isso é batata. Há vezes que o engano continua. E não se pode fazer nada. Mas, se temos uma proteção a mais, somos impedidos de fazer o que, inocentemente, tínhamos intenção de fazer. E somos preservados, a tempo, de um engano maior.
3/06/2016 - 16h29


terça-feira, 31 de maio de 2016

Lições de sábado 252


A poesia se escreve sem palavras, mas com palavras se escreve o poema. Com palavras se diz sim ou não, embora a boca não pronuncie nenhum som quando sorri. A boca assim comportada sabe quando falar e quando calar. Há poesia no silêncio. Mas há palavras num poema. Sem dizer nada, consigo expressar o que palavras não conseguem dizer. Os olhos falam. O silêncio fala. A língua nem se move. Mas ela se agita para dizer o poema e para dar e receber o beijo. Como na música, o poema é feito de palavras e silêncios, as pausas entre os versos, quando a mente começa a girar. E, nesse giro mágico, estão os sentimentos, que pousam sobre os olhos e a boca, e lhes devolvem o silêncio.

31/05/2015 - 17h25


domingo, 29 de maio de 2016

Lições de sábado 251

O que será depois que eu passar? A longa jornada que nunca finda. A infinda caminhada para onde não sei que vou. Sei, no entanto, porque vou. Não há sentido em não ir, não há sentido em ficar parado, nem em esperar. Espero enquanto sigo. Sigo esperando que passe tudo que deve passar, e reste apenas o inexorável sentimento de quem superou tudo, viveu tudo, viu tudo, e ainda que ver e viver mais. Porque há muito mais a ser vivido depois de viver tudo que havia para se viver.

29/05/2014 


sexta-feira, 20 de maio de 2016

Lições de sábado 250

Aprendemos a caminhar caminhando. A falar, falando. A amar, amando. Tudo é prática imediata. Nada em teoria se pratica. Só a prática é praticada. E o que em teoria não se aplica, na prática, pode ser explicada. Aprendi a ler, a escrever, a compreender, a deduzir, a somar e subtrair, a dividir e multiplicar. Aprendi, inclusive, a aceitar e a não aceitar. Aprendi o que se leva muito tempo para aprender, e o que se aprende imediatamente, através do amor. O amor é prática. E amor, só na prática. Em teoria, não existe.
20/05/2016 - 19h40




segunda-feira, 16 de maio de 2016

Lições de sábado 249

O menino encontra Manuel Bandeira na praça
Meu amigo Pedro Lage, aos dez anos, conheceu Manuel Bandeira, apresentado pela avó, numa feira de livros no centro da cidade. Ao saber que aquele era o poeta que havia escrito os poemas que ele lera, imediatamente perguntou a Bandeira:
- Você esteve em Pasárgada?
O poeta sorriu e disse que não. Pedro ficou inconformado. 
Nessa história, três coisas me assombram: primeiro, ter tido a chance de encontrar o poeta apresentado pela avó, segundo, conhecer o poema "Vou-me embora para Pasárgada" aos dez anos de idade, e terceiro, ter feito essa pergunta a ele à queima-roupa. Só um dos fatos já me encantaria, mas os três juntos, são sublimes.
16/05/2016 - 17h12


domingo, 15 de maio de 2016

Lições de sábado 248

Há muita semelhança nos acasos: tudo que se parece guarda um sinal mais antigo que já estava lá.
16/05/2016 - 0h50



Lições de sábado 247


O que os olhos não veem o coração não sente, pois se vissem, o que pensariam? Imaginar, essa arte que antecede o feito, concilia o não visto com o que se pode ver. Ver na mente é concebê-lo e do concebido partimos para a forma, à execução, ao ato. Não basta querer: é preciso realizá-lo. Mãos à obra.


15/05/2016 - 1h07



Lições de sábado 246

Quem tem histórias maravilhosas para contar, escreve livros. Conta suas próprias histórias. Quantas coisas vivemos que nem contamos. E quando as reproduzimos é que percebemos como aqueles fatos nos moldaram, nos fizeram ir à frente, sem perceber. E como tivemos sorte.

14/05/2016 - 23h37


sábado, 14 de maio de 2016

Lições de sábado 245

Lendo sobre a guilhotina, e vendo fotos que tirei em Versailles em março de 2005, constato como o tempo une contradições e signos contrários. Aqui onde os Luíses de França viveram, onde o fausto e ostentação existiram, a débacle da Revolução Francesa, seguida da imperiosa ascensão de Napoleão, que só depois de Waterloo retomou seu curso, até a II Guerra Mundial, dividida entre a França do governo conivente e a Resistência, De Gaulle, Mitterrand, Sarkozy e agora Hollande, surge como símbolo deste país que serviu de exemplo para tantas nações, incluindo a nossa. A guilhotina foi usada até 1977 e desativada por Mitterrand em 1981, quase 200 anos depois de ter sido usada pela primeira vez, em 1792. Maria Antonieta, uma das mais célebres executadas, entrou na história da França pela porta da frente e morreu como herege. Lembra-me Leopoldina que se sacrificou pelo povo brasileiro, depois de dar-lhe um herdeiro e lutar pela Independência. Essas mulheres são sempre os pivôs de todas as mudanças cruciais na História da humanidade. Como uma coisa leva à outra, a Inconfidência Mineira, que aconteceu ao mesmo tempo que a Revolução Francesa, é a referência para todas as mudanças que aconteceram depois. Da França ao Brasil, a história continua. E, ao olhar por essas janelas, colocamo-nos no mesmo lugar desses Luíses, dessas rainhas que um dia governaram a França e olhamos para o horizonte, onde surgia o nosso Brasil.

6/11/2011


quinta-feira, 28 de abril de 2016

Lições de sábado 244


Há um momento em que o arrependimento não é mais necessário. Tanto fizemos para seguir em frente que não importa mais o que tivemos de deixar para trás. Importa o que ficou conosco. Importa quem está conosco. O efêmero e o permanente. Sempre viveremos essa dicotomia. O que fica e o que passa. E o que fica guardado em nós.

27/04/2016 - 00h52



quinta-feira, 21 de abril de 2016

Lições de sábado 243


Aprendemos que a vida é uma dança entre as pessoas que vêm e vão, que tudo passa, que nada fica, somente o amor que sentimos pelos outros. Amar e ser amado é a única missão terrena e, para isso, os seres humanos se confundem do começo ao fim, não sabem por que nascem, não sabem por que vivem, e também não sabem por que morrem. Mas vivemos à procura de um sentido, que só encontramos nos amigos, nos filhos, nos pais, nos que nos são mais caros. Viver é a eterna busca do amor. E se esse amor não se revela em nossos atos, não saberemos por que vivemos, porém existir já é a magia necessária para começarmos a descobrir.

21/04/2012


sexta-feira, 8 de abril de 2016

Lições de sábado 242

MIND THE GAP

Estamos tão acelerados (ou desacelerados) em relação aos últimos acontecimentos, que hoje não parece sexta, a semana passou voando, o tempo relativo difere do tempo absoluto, e nos sentimos vivendo um hiato, um lapso, um gap, até que tudo se conclua, ao serem marcadas para domingo a decisão que poderá mudar ou acertar o destino do país. Um destino que vem a cada dia degringolando mais ainda, com vazamento de delações, com novas declarações e depoimentos paralelos, com gravações inesperadas de confissões em tribunais, sentimentos misturados sobre o que vem nos assoberbando sobremaneira, que hoje parece sexta-feira, talvez segunda ou terça, porque o tempo relativo não é o absoluto e nos vemos cercados de ameaças, de hesitações, de afrontamentos que nunca esperávamos sofrer, nem testemunhar. O crime tornou-se banal. A corrupção tornou-se diuturna. A vida parece não ter mais valor diante de tanta mágoa, tanto horror. Já não bastavam as notícias ruins de cada dia, em que eu pensava: "Esta é a pior notícia que eu já li", e no dia seguinte, eu lia uma pior ainda. Estamos sendo enxovalhados com más notícias. Uma guerra psicológica está em andamento. Um golpe de notícias pavorosas. Fora os sofrimentos do dia a dia, da falta de remédios, médicos, atendimentos, salários, empregos, trabalho, dinheiro. Nunca antes na História deste país estivemos tão sofridos (ou sofremos mais, e não me lembro?). O cérebro não se lembra de dores passadas, só das presentes. A dor que passou é uma dor que superamos. E a dor presente ainda não se foi. Por isso parece maior que todas as outras. E, enquanto tudo isso durar, estaremos indo ladeira abaixo, às vésperas da primeira Olimpíada que irá acontecer no Brasil. A Copa do Mundo foi um pavor. Que a Olimpíada pegue mais leve.

8/04/2016 – 18h02

Ilustração de Julia Flohr 

domingo, 27 de março de 2016

Lições de sábado 241

"Um beijo não dado é um beijo perdido para sempre", gritou Ana Heloísa Páscoli na sala de aula quando tínhamos treze anos. Eu não sei onde ela leu essa frase, nem quem a escreveu, mas vivíamos buscando máximas para trocar todos os dias. Não sei por quê, ela abriu os braços de frente para a classe, e soltou essa exclamação como a maior verdade encontrada. Eu parei. Aquilo me tocou de tal forma, que, a partir daquele momento, passei a tomar minhas decisões a partir dessa frase. O que eu não fizesse, eu não teria mais a chance de fazer, não do mesmo modo, caso a oportunidade voltasse. Então assim pautei minha vida, para não perder para sempre nada que eu realmente quisesse. Todas as minhas escolhas por trinta anos seguiram essa norma, e arrisquei fazer coisas que talvez não devesse, mas pela urgência daquilo que não voltaria, escolhi o que não quis colocar de lado. Ao reencontrá-la depois desse tempo, perguntei-lhe se ela se lembrava de ter dito essa frase. Ela disse que não, mas que tinha sido bom eu ter-lhe lembrado. Dois anos depois, Ana Heloísa adoeceu e veio a falecer. As escolhas para ela haviam acabado, mas não para mim. 

No dia do enterro, eu me atrasei. Peguei o táxi em Copacabana já depois de o velório ter começado e, mesmo assim, parti para o Caju. Ao sentar no carro, tocava uma música dos Carpenters. Eu me espantei pela coincidência de ter sido aquele o fundo musical de nossa adolescência. Mas ao se seguir outra e mais outra música cantada por Karen, perguntei ao motorista o que estava tocando. Ele disse ser uma fita antiga, que ele ouvia uma vez por semana. De todos os táxis no Rio de Janeiro, entrei no único que tinha uma fita dos Carpenters para me levar para o enterro de Ana Heloísa naquela manhã, tocando ao final "Close to you". Chorei todo o caminho.

Ao chegar lá, já haviam seguido para o crematório, do outro lado da entrada principal. Aturdida, atravessei o cemitério, em meio a imagens de anjos e Cristos crucificados, numa visão hiper gótica, sob um forte mormaço. No centro do cemitério, havia um cruzeiro que marcava a metade do percurso que ainda deveria seguir. Nesse momento, me veio um pensamento bem alto para que eu não deixasse de ouvir: "Um beijo dado é um beijo guardado para sempre", como uma resposta àqueles trinta anos de indagação. De onde ela estava, Ana Heloísa me dava a resposta que eu tanto procurara. O que eu não vivi, não voltaria, mas o que eu vivesse, guardaria para sempre. Essa foi a solução que ela me trouxe, resolvendo a equação que eu deixara por tanto tempo em aberto. Só poderia ter vindo dela, a mesma que me apresentou a questão, que conduziu toda a minha vida.

27/03/2016 - 22h15 - Domingo de Páscoa


XX
Para Ana Heloísa Páscoli (1957-2001)

Um dia a menina gritou:
“Um beijo não dado é um beijo perdido!”
e ecoou numa eternidade e seguiu sei lá para onde,
atravessando um ouvido lá, um peito ali,
talvez uns olhos.

Eu atravessei a vida,
os desertos, os oásis e seus rostos
e um dia chegou a mim e ouvi:
“Um beijo não dado é um beijo perdido!”

Pasmo, confuso, aturdido,
vi o clarão no meu caminho para Damasco,
olhei para trás e pensei:
“Meu Deus, meus Deus...
O que deixei pelos caminhos,
tudo perdi, só agora o sei...”

in "Diários de amor perdido" (2008), de João José de Melo Franco






quinta-feira, 24 de março de 2016

Lições de sábado 240

"Não são os ossos que garantem a imortalidade à Mona Lisa, mas, sim, o sorriso". Esta frase de Flavio Sanso, se nos pega desprevenidos, provoca uma reação imediata. Não é a tenra carne de sua face, nem a calidez de suas mãos, nem o contorno de seus ombros que nos cativam há 500 anos (1503-1517), mas a lembrança de seu sorriso que perdura por muito tempo depois de vê-lo, seja ao vivo, seja em foto, numa reprodução barata, numa camiseta, sempre será a Mona Lisa eternizada, tantas vezes repintada, estilizada, repetida como um ícone contemporâneo à la Andy Warhol. Nenhuma mulher de seu tempo foi tão glamourizada, como uma Princesa Diana da Renascença. "Nada é mais extremo que a permanência", escrevi num poema que publiquei em pôster, em 1983, chamado "Décima lua" e depois no meu livro "Areal", em 1995. Este verso se destacou dos demais justamente por conter uma verdade intocável: não há nada que queiramos mais do que a permanência. E pelos rastros deixados por nossos antepassados, tentamos descobrir como viviam, o que pensavam. O que pensava a Mona Lisa? Como a Dama Negra dos sonetos de Shakespeare, só a descrição deixada pelo Bardo nos traz esses indícios. Como vivia Marília de Dirceu? Só Tomás Antônio Gonzaga a descreveu. A perpetuidade dessas mulheres nos assombra, pois, na idolatria de seus amados, conseguiram passar à história como a perenidade das estrelas. Ora, direis... decerto perdeste o senso. Mas não são as mulheres que provocam esses suspiros que se perpetuam nos poemas, nas esculturas, nas lápides, nas pinturas, nos nomes dados a tantos objetos? O que garantiu a imortalidade à Mona Lisa foi seu sorriso e a mão que a pintou. Leonardo Da Vinci fez muito mais do que isso, mas foi este quadro, por sua vez, que o imortalizou.  

24/03/2016 - 18h42




sexta-feira, 18 de março de 2016

Lições de sábado 239

"É preciso ter drama", me disse certa vez a professora de roteiro na Universidade do Colorado, em Boulder. Não adianta criar uma história que não tenha embate. Tem que haver conflito. Tem que haver antagonismo, senão a narrativa não decola. Fiquei pensando longamente sobre isso, no início de 2005, enquanto criava os diálogos centrais de "Breve anunciação", minha peça de teatro que estreou em junho de 2013 e permaneceu dois meses em cartaz, no Solar do Jambeiro, em Niterói. Escrevi pensando em descrever um relacionamento, colocar tudo que gostaria que pudesse ser ou tivesse sido dito entre duas pessoas que se amam. Muitas das falas foram criadas, outras apenas reescritas, mesmo fora do contexto inicial. A experiência me mostrou que o drama é a melhor forma de passar uma mensagem. Não adianta apenas enunciar. Tem que haver dor e separação, negação e mentira, para que se descubra a luz da verdade, o instante divino, o abraço do amor. No contraste, descobrimos o que precisamos ver. E, na dramatização do desejo, sabemos como expressá-lo. Talvez sejam dessas experiências que precisemos para atravessar o deserto do desconforto, a fímbria do fim, o absurdo das circunstâncias, para valorizarmos "o tempo presente, os homens presentes, a vida presente", como nos disse Carlos Drummond de Andrade, em seu poema "Mãos dadas", em "Sentimento do mundo". 

18-03-2016 - 22h29

Mãos Dadas

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos, mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.


in “Sentimento do Mundo”





sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Lições de sábado 238

Há coisas que crescem à sombra de outras, não porque não possam existir ao sol, mas por ser sua forma de existir. Há coisas que precisam de uma proteção maior e alguns vivem para criar essa proteção. Nem todos possuem a mesma natureza.

25/02/2016 - 19h38


quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Lições de sábado 237

A palavra não tem corpo, porque é ar, hálito de homens e deuses que se comprazem em ouvi-los. O diálogo entre os homens e Deus existe desde o início, pois ele é o Verbo, e como Verbo, é feito de palavras. E Deus fez a luz, o céu e as estrelas, e fez o Homem e a Mulher, depois de criar todos os seres, eis o princípio de tudo, a Criação, para que dela viessem os poetas para falar ao mundo de onde Ele veio. O poeta é a melhor lembrança de Deus, pois, por Ele, o Verbo existe. Erga Omnes.


25/02/2016 – 14h15


domingo, 21 de fevereiro de 2016

Lições de sábado 236

Há dias em que vivemos grandes histórias, que superam de longe outros dias, justamente para nos lembrar que ainda não vivemos tudo, tudo pode mudar e cada dia é único em seus dons, talentos e maestria. Podemos ser avisados que algo irá acontecer, mas nunca saberemos de fato o que é até vivê-lo.

20/02/2016 - 20h02