segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Lições de sábado 193

"Do amor, não se faz biópsia, só se faz autópsia", disse-me um amigo citando outro. Várias vezes recorri a essa máxima, toda vez que tentava entender o momento que estava vivendo de certo relacionamento. Quando somos capazes de dissecar uma pessoa, ela já morreu. E, por algum tempo, mantemos o luto. E, em outro, mantemos distância. Tentamos entender racionalmente o que não se explica nem pela emoção. A emoção nos trai a todo momento, porque somente guardamos o que foi bom. E temos de nos lembrar o que não deu certo. O que nos tirou da rota e nos desviou do caminho. Que escolhas fizemos para nos proteger. Há homens impossíveis de amar. Por serem incapazes de demonstrar o amor que sentem. E expressam exatamente o contrário. Colocam a raiva e os ressentimentos em primeiro lugar. Não podemos tentar analisar tudo, pois não é uma sessão de terapia. Tentamos, parcialmente, compreender o que falhou, o que faltou, o que nos fez mudar de direção. Um encontro é carregado de expectativas, que se desenrolam suavemente e, por vezes, encontram obstáculos, surgem mal entendidos, criam-se problemas que não prevemos. Nunca prevemos problemas. Sempre temos de enfrentá-los a frio. Sem preparação. E não podemos desfazer as escolhas, nem retirar o que dissemos e o que ouvimos. Se um amor não deu certo, acertamos quando quisemos amar. E quando nos acreditamos amados. E, depois, quando não resta nem mais a ternura que nos aproximou, passamos a desfiar os enganos, os atos inesperados, as acusações esdrúxulas. Partimos. E, nessa separação, nos distanciamos rapidamente do ser que amamos, para passamos a vê-lo como miragem. Como ilusão de um dia ter amado alguém impossível de amar. Por se negar a receber esse amor como o oferecemos. Amor não exige fórmulas. Apenas brandura, porque ninguém é obrigado a ser quem não é, nem a obedecer ordens de um parceiro tirano. Na necropsia, retiramos o coração e o olhamos de perto. O que ele não possui que não conseguimos entender? Nem aceitar? E na mistura estranha de amor e ódio, aquecidos pela falta do ser que queríamos amar, vemo-nos inteiros, a acalentar um tempo que pareceu um sonho e, como de todo sonho, despertamos. 

16/02/2015 - 22h26




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